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segunda-feira, 28 de maio de 2012

A luta pelo serviço público da área agrária interessa a todos os brasileiros


Servidores do Incra e MDA paralisam novamente dia 28 de maio e exigem melhoria salarial e ampliação imediata do número de servidores


Almir Cezar, de Brasília (DF)



• O dia 28 de maio será marcado pela quarta paralisação conjunta convocada pela Cnasi (Confederação Nacional das Associações dos Servidores do Incra), Assinagro (Associação Nacional dos Agronômos do Incra) e Assemda. Em todos os escritórios do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) os servidores dos dois órgãos vêm realizando protestos e chamando a população a apoiar sua luta em defesa de melhorias no serviço público da área agrária.

Melhorar o serviço público da área de políticas agrárias melhora também a vida de todos os brasileiros. Embora 70% dos alimentos venham de pequenos produtores, 80% das terras estão nas mãos dos latifundiários e do agronegócio. E, embora a metade dos pobres viva no campo, este abriga apenas 20% da população. Cerca de 80% dos homicídios no campo envolvem conflitos de terra e 70% dos libertos de trabalho escravo são de lavradores pobres. Se os servidores do Incra e MDA não fazem mais e melhor, é porque faltam recursos e servidores.

Os sucessivos governos investem cada vez menos e não valorizam os trabalhadores do serviço público federal. O Orçamento de 2012 para pagar os servidores é o menor dos últimos 17 anos se comparado ao que a União arrecada (4,13% do PIB). Em compensação, dá mais de R$ 60 bilhões em isenções de impostos aos industriais e paga aos banqueiros e especuladores quase metade do orçamento (47%) em juros da dívida pública. 

Ao contrário do que a mídia diz, o Brasil tem um dos menores índices de servidores por habitante. Antes do contingenciamento do governo de mais de 70% do orçamento do Incra e MDA, estavam previstos recursos ínfimos de menos de 0,25% do orçamento Federal de 2012 para despesas no desenvolvimento agrário. Enquanto isso, o agronegócio e os órgãos de política agrícola seguem tendo tratamento diferenciado pelo governo, que incentiva a produção para a exportação de commodities e aplica a falsa tese de apoio ao desenvolvimento de uma “nova classe média rural”.

Nos órgãos da área agrária a evasão de servidores é grande: são baixíssimos os salários (um dos piores do serviço público federal) e não se renova e amplia o quadro de pessoal. O Incra tem hoje metade dos servidores que há 20 anos, apesar de ter ampliado o público beneficiado. O número de famílias assentadas passou de 117 mil para aproximadamente um milhão, totalizando cerca quatro milhões de pessoas – encerrando, assim, um verdadeiro paradoxo entre um crescimento vertiginoso de serviço e uma redução drástica de meios para atendê-los de forma consequente.

Daqui a 2 anos, ainda no governo Dilma, mais da metade dos servidores estarão em condições de se aposentar, inclusive alguns por imposição legal da idade máxima (a chamada “compulsória”), e provavelmente o farão, diante das constantes e difíceis condições de trabalho e pelas ameaça de perdas de direitos previdenciários.

O MDA, passados mais de 15 de anos de sua instauração, ainda no governo FHC, nunca foi devidamente estruturado. Além de poucos servidores, conta com menos de 1/5 do quadro próprio, sendo que quase 30% já saíram após 2,5 anos do único concurso. A grande maioria da força de trabalho do órgão é composta de terceirizados, cargos comissionados e consultores. E em alguns casos os servidores ganham menos que a média salarial da iniciativa privada, e a maioria está com sobrecarga de trabalho, afetando o atendimento da população rural e pondo em risco até a legalidade dos processos. 

Luta pelo desenvolvimento agrário
Na prática, ambos os órgãos estão sendo sucateados e a política de reforma Agrária conduzida à inviabilidade. Por essa situação, os servidores dos órgãos da área agrária estão luta na defesa do desenvolvimento agrário. É uma luta pela defesa da agricultura familiar, reforma agrária, regularização fundiária e desenvolvimento rural sustentável. Sua trincheira é o serviço público, onde pretendem estruturar os dois órgãos estatais da área agrária para atender as populações pobres do campo e promover o desenvolvimento nacional e a justiça social. E entendem que para isso, é preciso lutar por melhoria salarial e por mais servidores.

O movimento dos servidores esperava que a administração do MDA se somasse à luta, se fazendo presente nas mesas de negociação com o centro do governo e fornecendo dados sobre o quantitativo de servidores necessários para estruturação do órgão. Contudo, resposta da administração segue cheia de evasivas, embora os sucessivos ministros à frente do MDA sejam, desde o início do governo Lula, de uma corrente da esquerda do PT com fortes ligações com o movimento social.

Essa omissão é criticada pelos movimentos sindicais e populares do campo, em especial o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-terra), Contag (Confederação dos Trabalhadores da Agricultura) e Fetraf-Brasil (Confederação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar) que, durante o “Grito da Terra” e o “Abril Vermelho”, manifestaram seu apoio à pauta dos servidores. Inclusive, pressionando a Casa Civil e Secretaria Geral da Presidência, conseguiram uma reunião exclusiva do Ministério do Planejamento para o movimento dos servidores, contudo, também até o momento sem resultados concretos às reivindicações. Embora se prometa resposta em nova reunião para o dia 31 de maio.

Assim, os servidores do MDA e Incra seguem em campanha. Realizaram até agora três paralisações de advertência ao governo, incorporando-se às mobilizações da campanha salarial unificada dos servidores públicos federais, encabeçada pela Condsef, Cnesf e 3 centrais sindicais, entre elas a CSP-Conlutas. Realizam de maneira combinada atos setoriais e em conjunto com o movimento geral dos SPF’s, tanto em Brasília quanto pelas capitais e grandes cidades.

No dia 4 de junho, véspera da Marcha Nacional a Brasília, convocada pelo Fórum Nacional de Entidades dos SPFs, haverá uma plenária nacional dos servidores do Incra e MDA, com delegados eleitos pelos estados, para votar novos rumos do movimento e apontar pela construção da greve geral unificada, provavelmente a partir do dia 11 de junho, em conjunto com as demais categorias do serviço público federal.

A paralisação do dia 21 de maio
Na última paralisação setorial, na segunda-feira dia 21 de maio, os servidores estiveram parados em Brasília e em todo o país. Por volta das 11h, os servidores de Brasília foram até o MDA cobrar uma reunião com o ministro para que o mesmo nos desse uma reposta ao Ofício Conjunto das entidades protocolado no início de abril.

Cerca de 60 servidores do INCRA e MDA saíram do edifício Palácio do Desenvolvimento, sede do Incra e da maioria das secretarias do MDA, apelidada pelo movimento de Palácio do “Subdesenvolvimento”, subiram o Bloco “A” da Esplanada dos Ministérios e exigiram que a reunião fosse com o ministro Pepe Vargas e não com seu chefe de gabinete, conforme estava sendo proposto pela assessoria do MDA.

Depois de muita pressão, clima tenso, o MDA concordou em receber dois representantes das entidades presentes (ASSINAGRO, CNASI, ASSERA-Brasília, ASSEMDA e SINDSEP-DF) numa reunião de 15 minutos. Registre-se que a assessoria e a chefia de gabinete do MDA classificaram o ato democrático dos servidores como uma invasão, inclusive colocando segurança armada para impedir a entrada/permanência dos servidores no 8º andar. 

Os representantes das entidades bem como o conjunto dos servidores rebateram de pronto as alegações, pois não se tratava de uma invasão, mas sim de um ato democrático de servidores da casa, devidamente identificados com crachá, e que reivindicavam reunião com o Ministro.

Durante a reunião, foi cobrada uma ação mais eficaz do MDA, haja vista a reunião marcada para o dia 31 com o no Ministério do Planejamento (MPOG). O ministro rebateu dizendo que “está fazendo seu papel na defesa dos servidores e dos demais assuntos afeitos ao MDA/INCRA”. As entidades cobraram um papel mais efetivo do MDA com o envio de Aviso Ministerial em defesa da pauta salarial dos servidores. O Ministro entendeu ser desnecessário, alegando que “papel acaba ficando engavetado no MPOG”.

As entidades deixaram claro que outros ministros assim o fizeram, inclusive citando o exemplo do Ministério da Agricultura, que levou a pauta dos servidores "debaixo do braço" e hoje as carreiras desse ministério que cuida das políticas agrícolas, e é bem visto pelo agronegócio brasileiro, encontram-se comparativamente em situação bem melhor, ganhando o dobro, e em alguns casos o triplo de um servidor do MDA e Incra com cargo, funções e escolaridade equivalente.

Além disso, foi cobrada sua participação na reunião com o MPOG. O ministro disse que vai avaliar com o MPOG a necessidade da participação de representantes do MDA e que mesmo que haja participação, a posição será a mesma do Governo, isto é, não estarão ao lado dos servidores. Após a reunião, que também ocorreu em clima tenso, restou dúvida se enviaria ou não o Aviso Ministerial. A assessoria ficou de comunicar as entidades se o Ministro irá ou não formalizar o apoio aos servidores, contudo até agora sem resposta.

Almir Cezar Filho é economista e servidor do Ministério do Desenvolvimento Agrário, diretor da ASSEMDA, coordenador da CSP-Conlutas no Distrito Federal e militante do PSTU